The Path #21

      Nessa noite não pude evitar pensar naquele momento. O que teria acontecido se não tivesse virado as costas? Será que era o certo a acontecer? Mas... Ele não é como eu. Eu não posso arrastá-lo para uma luta que não é dele, isto não é nenhum jogo. É a pura realidade. Não posso deixar alguém, que não tem culpa alguma disto, sofrer... Pelo contrário, tenho de proteger acima de tudo. 
      Por um instante a minha mente clareou. Esqueci todos os meus pensamentos e um momento surgiu; estava a ter outra visão: encontrava-me no jardim, debaixo da árvore grande... Não estava sozinha, Tiago estava comigo, aproximava-se para me dar um beijo. Apenas sorri, não reagi. Deixei-o vir ter comigo, abracei-o e beijei-o de volta. Eu estava com Tiago. Aos beijos. No meu jardim. Mas o pior não era isso: da porta que dá entrada ao alpendre, estava Sol a ver aquilo tudo. Senti a sua tristeza a apoderar-se de mim, a tomar-me. No entanto, uma parte de mim sentiu-se completa e totalmente feliz.
      O momento foi desvanecendo aos poucos. A minha mente voltou lentamente ao normal e eu estava em choque. Estava em choque comigo mesma: eu a beijar Tiago assim do nada?; estava chocada com Tiago: como é que ele conseguiu entrar na minha vida tão facilmente?; estava chocada com Sol: onde é que ele andou? E qual o motivo para ter voltado logo agora? 
     Eu a pensar que a minha lista de problemas estava a ficar cada vez mais curta e afinal... Agora tenho este gigante e catastrófico problema nos meus ombros. Espero conseguir evitar tudo isto, pelo bem de todos. 
      Persifal veio ter comigo e adormeceu na almofada ao lado. Tive dificuldades a adormecer, a minha cabeça não parava de imaginar os mais variados cenários e nenhum deles me agradava. Perder Sol por um desconhecido é tão errado, não me conformo com as minhas atitudes. Sol pode ter partido mas eu não deixei de amá-lo e sei que ele também não me deixou de amar, eu sinto. Como posso me esquecer disso assim do nada? Isto está a dar comigo em louca.





     Acordei com uma dor de cabeça infernal. O meu mau humor estava em alta e a minha paciência limitada. O meu dia estava decidido: iria ser passado enfiada no quarto. Assim não perturbava ninguém. Fui tomar um banho para desanuviar a nuvem negra que pairava sobre mim e vesti-me. Desci para tomar o pequeno almoço, a avó viu logo a minha cara de zombie e por isso começou com o interrogatório.
- O que se passa Luna? Sabes que podes contar-me - dizia.
- Não se passa nada avó, estou só cansada - repeti pela quarta vez.
- Cansada do quê?
- Da vida avó... da vida.
- Isto é por causa de Sol?
- Também.
-  E mais quem?
- Eu. Nada está bem avó. Sol partiu sem data de retorno, deixou-me aqui sozinha quando prometeu que tudo ia ficar bem e que íamos enfrentar tudo juntos e eu não entendo. Não entendo... não entendo o porquê de ele ter feito isto.
- Ele vai voltar, vais ver. Ele partiu por um bom motivo, acredito nisso.
- Pois. Talvez. Quero acreditar nisso também - respirei fundo. - Enfim. Preciso de comer. O que é o pequeno-almoço?
- Há panquecas, fruta, se quiseres posso fazer umas torradas, café, sumo.
- Acho que fico pelas panquecas - disse.
     Avó colocou doce e alguma fruta nas panquecas e o meu dia logo melhorou um pouco. Os miminhos dela eram o que mais me ajudavam apesar de tudo. A minha avó.
     Assim que acabei o pequeno-almoço fui buscar Persifal para ele comer. Passa a vida a dormir e esquece-se de comer. Esperei que ele acabasse a sua refeição para levá-lo comigo para o quarto. Já que ia passar o dia lá fechada mais valia ter boa companhia.
- Luna.
- Mercúrio?
- Bom dia - sorriu.
- Olá.
- Passa-se alguma coisa?
- Não dormi bem só isso.
- De certeza? Parece que algo de perturba.
- O mesmo de sempre. Tu sabes - respondi pronta para acabar aquela conversa e enfiar-me na cama.
      Mercúrio percebeu que não estava para conversas, deixou a cozinha num piscar de olhos e foi ter com a avó no alpendre. Levei Persifal comigo para o quarto e coloquei a caminha dele em cima da minha, ao meu lado, e ficámos a ver filmes até a hora do almoço.
- LUNA, VEM CÁ ABAIXO - gritou avó.
- E pronto Persifal, a nossa paz foi arruinada.
       Desci num estado miserável e dei de caras com uns brilhantes olhos esverdeados.
- Tiago... O que estás aqui a fazer?
- Bem, vim convidar-te para almoçar - fez uma pausa e observou-me - mas parece-me que não estás com disposição.
- Oh nada disso, ela almoça contigo sim - assegurou-lhe avó.
      Enviei um olhar chateado para avó - Hum, podemos almoçar aqui?
- Sim, eu preparo-te algo.
- Oh não... Vens cá a casa e ainda tens de fazer o almoço? Não. Nope.
- Porque não? Não cozinho bem?
- Cozinhas.
- Então qual é o problema?
- Pronto, está bem.
       Tiago sorriu - Volta lá para a cama. Já lá vou com um almoço para ti, pode ser?
      Hesitei. Tiago olhou-me como um cãozinho abandonado: impossível de resistir.
- Okay, pode ser - soltei um sorriso não muito convencido da minha decisão.
     Depois de tudo o que andou na minha cabeça durante a noite, cedi na primeira oportunidade. Deixei Tiago provar mais um pouco da minha vida e isso ia trazer-me graves consequências, consequências essas que me iam custar Sol. Apenas suplicava que Lua me indicasse o caminho certo a percorrer porque eu certamente não estou a ir por ele. 
      Fui para o quarto com remorsos. Não devia ter deixado Tiago fazer-me o almoço, quanto mais trazer-mo à cama. Persifal enrolou-se no meu colo e começou a pedir festinhas desagradavelmente. No entanto, eu estava disposta a dá-las. Ele merece. Mais do que ninguém, é ele que atura a minha má disposição de manhã, o meu pequeno Romeu.
O tempo deve ter passado a voar porque num instante Tiago bateu-me à porta com um tabuleiro cheio de coisas boas. O cheiro era divinal e colocava água na boca.
- Cheira tão bem - disse.
- E espero que seja tão bom quanto cheire - respondeu.
      Tiago colocou o tabuleiro na cama e vi que o prato tinha muito bom aspeto. Massa farfalle com molho de tomate, queijo ralado por cima, algum fiambre cortado em pequenos quadradinhos, algumas ervinhas para dar um certo sabor e um grande copo de coca-cola.
- Não comes esta refeição divinal? - perguntei.
- Hm, não.
- Não vais ficar a ver-me comer - e isto lembrou-me de Sol. Disse-lhe o mesmo quando ele preparou-me um almoço.
- Tudo bem Luna? - Tiago deve ter reparado.
- Sim, mas come. Não vais ficar a ver-me comer.
- Pronto, está bem, vou buscar um prato para mim.
      Saiu do quarto e eu não aguentei a confusão na minha cabeça. Tiago claramente quer aproximar-se de mim, e ele faz lembrar-me de Sol um pouco e isto não é certo. Não é o caminho que devia ter escolhido. Estou a ceder, e se continuar assim, vai acontecer o mesmo que aconteceu quando Sol estava cá, vou apaixonar-me e eu... eu não posso. 

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