Underneath: Silver #20

     O zumbido seguiu-os para onde eles foram. Troy rodopiava no ar, cheio de neve e frio, como se estivesse preso um furacão. Gritou pelo nome do seu melhor amigo e das gémeas mas graças ao zumbido a sua audição estava surda e a voz muda, e o seu braço direito não conseguia chegar a ninguém. O vento agitou-se ainda mais. Troy fechou os olhos e logo os tornou a abrir. Viu de relance, por entre os infinitos flocos de neve, o cabelo castanho de Catarina e, embora os seus pensamentos não estarem organizados, apenas um lhe fazia sentido: algo muito mau tinha acontecido para ela estar com ele naquele furacão. Chamou por ela mas acabou por emitir nenhum som. Rodopiou mais uma vez. A neve agitava-o para todos os lados e fazia-o sentir-se demasiado tonto para estar com os olhos abertos - consciente. E, quando voltou à mesma posição de queda, sentiu a mão de alguém na sua e apesar de não conseguir manter os olhos abertos para ver quem era, Troy sentiu o seu coração palpitar fortemente e então, cedeu à tempestade.


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      Ela olhou em redor e embora tudo estivesse igual, sentiu um arrepio percorrer-lhe o corpo todo que lhe assegurou que nada permanecia da mesma forma. Ao fechar os olhos, visualizou cada porção do Planeta numa questão de segundos. Com o coração a palpitar e o corpo a receber a energia que tanto lhe faltava, ela viu a luz a brilhar da sua linda e perdida Estrela.


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- Troy - gritava ela, desesperada. - Troy! 
- Catarina! - Troy exclamou. 
     A sua mão percorreu a neve que estava tão determinada em separá-los. A mão de Troy apertou bem a de Violet e puxou a outra para Catarina. Para andar naquela tempestade, os cinco uniram-se pelas mãos como uma corrente. Melody e Ryan era os primeiros, depois Violet, e finalmente ele e Catarina. Juntos, caminhavam na direção de qualquer coisa, de uma luz, de um traço de fumo, de uma vivalma. 
- Troy! - gritou Ryan, - Temos de parar! 
     Ele parou e puxou Catarina para junto de si e aproximou-se de Violet. Os cinco formaram um círculo. Ryan fitou Melody e ela criou uma bolha protectora de ar que os separou da tempestade. Todos pareciam devastados e com as forças a esgotarem-se. Ele, principalmente, estava prestes a ceder ao cansaço. 
- Não sei quanto tempo podemos continuar assim - falou Ryan. 
- A Vi precisa de cuidados - Melody adicionou. 
     Troy olhou para ela. Tinha a pele tão clara agora, dando-lhe uma tonalidade pálida e doente. O seu top ligeiramente levantado mostrava um corte na sua marca. Se ele ao menos se lembrasse do que tinha acontecido depois de ter levado com um fio da criatura no ombro... 
- Eu estou bem - murmurou Violet, a levantar a cabeça do ombro da irmã. Troy viu no rosto dela que estava demasiado fraca e os seus olhos denunciaram a recaída. Ele esticou-se e Violet caiu nos seus braços. 
- Hey - disse ele. - Não adormeças - sorriu-lhe preocupado. Violet acabou por desmaiar. Ele fitou Melody.
- O que fazemos? - perguntou Catarina. 
- Malta - chamou Ryan. - Estão a ver aquela luz ali ao fundo ou sou só eu? 
     Troy colocou Violet mais junto ao seu corpo e levantou-se. Deu a mão a Catarina e olhou para lá da bolha de ar. Apesar do ar da bolha estar sempre em movimento e da confusão para lá dela, era visível uma luz brilhante. Ryan agarrou na mão da Melody e da Catarina. Esta última ficou com a mão de Troy na sua e ele com Violet junto de si. Finalmente, os cinco partiram para a tempestade a caminho da luz misteriosa. 


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     No segundo em que a bolha de ar se desfez, a tempestade desapareceu. O céu estava brilhantemente azul escuro com uma lua grande pousada no cimo. Em redor deles havia um lago que reflectia tudo no céu. Os cinco estavam pousados numa espécie de mini ilha, ornamentada de flores de cor intensa. O lago possuía nenúfares por todo o lado, porém, havia um único local onde isso não acontecia:  a origem daquela luz. 
     Pousada no lago como se não fosse feito de água estava uma elegante mulher. Tinha os olhos cinzentos reluzentes como a Lua, os lábios bem traçados e o cabelo branco como uma pérola. Apesar do seu cabelo, de velha nada tinha. Aliás, parecia que a sua pele se iluminava cada vez mais, tornando-se mais viva e fresca a cada segundo. A mulher avançou, pisando na água como se fosse chão. O seu vestido azul arrastava-se pela água sem ficar molhado e por onde passava, peixes começavam a percorrer as águas. Catarina chegou-se a Troy. Ele fitou-a de soslaio, sem querer desviar a atenção da mulher que caminhava  na sua direcção. Parecia que a conhecia só que ele tinha a certeza que nunca a tinha visto.
- Tema - disse. Colocou o rosto dele nas suas mãos. - Estás tão novo! Nunca te tinha visto assim - afirmou. 
- Hum.. chamo-me Troy - murmurou ele.
     Ela largou o rosto dele brutalmente.
- Oh, pois é. O Noir disse que agora chamavas-te assim. Nuances - encolheu os ombros. 
- Disseste Noir? Conhece-lo? - perguntou Melody. 
- Claro que conheço, que raio de pergunta é essa? - Ela passou o olhar pelos cinco. - Quem são estes, Tema? Não interessa - acrescentou, sem dar tempo de responder a ninguém. - Andem, vocês têm cara de quem precisa de uma cama - ela começou a andar pelo mesmo caminho que tinha feito. Nenhum dos cinco avançou com medo de cair no lago. - Podem vir. Não vão cair, prometo. 
     Eles avançaram e seguiram a mulher. Pararam então no local onde ela tinha surgido. Os cinco ficaram em roda dela à espera. Uma camada fina de água rodopiou, oriunda do lago. Envolveu-os sem os molhar e começou a girar com muita intensidade. Troy sentiu o seu corpo tornar-se leve demais, como uma pena, e Violet parecia que ia escarpar-lhe dos braços. A mulher sorria-lhe. Troy apertou Violet contra si e fechou os olhos quando uma luz intensa surgiu da mulher e quando os abriu, os seus olhos não queriam acreditar no que viam.  


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- Como te chamas, mesmo? - perguntou Ryan a inspeccionar o local. 
- Srebaryan - disse, vagarosamente.  - Mas podes chamar-me Silver. 
     Troy e Ryan fitaram-se a tentar conter o riso. O nome verdadeiro de Silver era ridículo, mas ao olhar para ela - uma espécie de deusa no seu reino mágico - já não era assim tão engraçado mas sim espectacular.  
     Os cinco estavam numa espécie de estufa. Troy conseguia distinguir algumas paredes mas o tecto estava escondido por algumas plantas e uma luz intensa que vinha da clarabóia. Não havia tantas plantas como numa verdadeira estufa. Apesar da imensidão do espaço, existia apenas um numero suficiente de plantas para tornar o local num refúgio mágico. Silver estava confortável numa chaise longue, de estilo vintage, branca. 
- Troy - chamou Catarina. - Podemos falar? 
- Sim, claro - disse. Fitou Ryan de relance. Os dois foram para um local mais sossegado. - O que se passa? 
- O que se passa? - repetiu ela, perturbada. Troy passou a mão pela cara ao aperceber-se do que se tratava. - Explica-me o que se passa. Diz-me que isto é real porque senão acho que vou dar em louca - disse. 
- Não estás louca - disse ele, a por as mãos nos ombros dela. Troy suspirou. - O que viste no jardim das gémeas? 
- Vi-te no meio duma confusão. Uma criatura negra a transformar-se em cinzas. Tinhas os olhos brancos. Completamente brancos, Troy. Depois agarraste a Violet e uma luz surgiu e ias desaparecendo com as gémeas e o Ryan. Eu chamei-te, mas tu não me ouviste ou talvez tenhas-me ignorado, não sei. 
- Catarina - disse-lhe ele. Abraçou-a. Pousou a cabeça na dela depois de beijá-la. - Eu nunca te ignoraria. - Afastou-a um pouco. - Tu sabes isso, não sabes? - Acariciou-lhe o rosto ao afastar o cabelo da cara. 
- Então conta-me o que aconteceu. 
- Eu sou... 
- Evans! - chamou Ryan, a afastar um conjunto de heras. - A Violet está a acordar - disse. - Anda. 
     Troy suspirou - Falamos depois, eu prometo-te - beijou-lhe a testa e levou-a de volta para perto do grupo de mão em mão. 
     Violet estava deitada junto a Silver. A sua pele estava ainda pálida e via-se perfeitamente que estava em dores. Estava uma pouco suada e alguns cabelos estavam colados no rosto. Melody estava ajoelhada ao lado dela. Troy lembrou-se de vê-las assim uma vez. 
- Então dorminhoca? Como te sentes? 
- Como se tivesse sido atropelada cinco vezes seguidas - respondeu. A sua voz estava um pouco rouca. Violet olhou em volta e ia começar a sentar-se mas a irmã impediu-a. 
- Fica deitada, e é uma ordem. 
- Onde estamos? 
- Em Srebaryan - respondeu Ryan com um sorriso gozão. Silver fitou-o de relance e ele tirou o sorriso do rosto. - É um dos planetas do Tema - adicionou. 
- Troy - disse entusiasmada. -  Como conseguiste? 
- Não sei - encolheu os ombros. - Mas isso agora não interessa. Temos de por-te bem. 
     Silver aproximou-se dela. 
- Esta é a Silver, ou melhor, a Srebaryan - disse-lhe a Melody. - Ela consegue curar-te. 
- Não sei se consigo fazer a tua marca voltar ao normal - admitiu. - Mas vou fazer o melhor que posso. - Violet assentiu. - Pode doer, talvez queiras apertar a mão de alguém. - Melody deu-lhe a mão e Silver prosseguiu.
     Primeiramente, Violet não sentiu nada de extraordinário. Parecia um leve formigueiro a percorrer-lhe o corpo. Mas depois foi como se infinitas agulhas a estivessem a picar numa ferida em carne viva e a seguir veio a sensação de calor. Ela arqueou as costas ao sentir aquele ardor. Parecia que a sua cabeça ia rebentar. Sentia que tinha um vulcão dentro de si a queimar-lhe o corpo todo. Violet cerrou os dentes a tentar conter os gritos e apertou fortemente a mão da irmã.
- Silver - disse Troy ao ver o sofrimento da Violet. - Silver, estás a magoá-la!
- Troy - disse-lhe Melody. - É para o seu bem.
     Ele levantou-se e ficou de costas para o que se passava. Catarina fitou o seu namorado, nunca o tinha visto tão aflito por alguém daquela forma. Violet soltou um grito rouco e Troy virou-se de repente. Ia obrigar Silver a parar com aquilo mas o Planeta já se tinha afastado dela. Violet ficou de olhos fechados por instantes mas quando os abriu, nenhuma dor se transparecia neles.
- Vi - sorriu Melody. - Sentes-te melhor?
- Sinto-me renovada - respondeu ao sentar-se. Notava-se a respiração ofegante mas Violet não sentia dores nenhumas. As irmãs abraçaram-se - A minha marca - murmurou ela.
     Violet levantou-se e ergueu um pouco o top revelando a sua marca unida de novo por um traço reluzente de vários tons de azul e prata, que, para Troy, lembravam um pouco de quando a luz ilumina a água.
- Eu não consigo fazer o preto da tua marca original, espero que não haja problema - disse-lhe Silver.
- Isto é muito mais do que te posso pedir. Obrigada - respondeu Violet.
     Silver sorriu-lhe de volta e fez um gesto com a mão fazendo surgir uma esfera de água ondulante. - Vamos?
- Onde? - Inquiriu Troy.
- Para casa, ora - disse ela e num piscar de olhos, o grupo estava a ser levado por uma onda de água e luz.
     

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     Os olhos vermelhos de Mercúrio palpitavam como se fossem um coração vivo. Luna nem conseguia olhar para ele porque sabia que só o exaltaria ainda mais. Já Sol encarava-o com uma seriedade total misturada com preocupação e cansaço. 
- Tu não podes ajudar-nos nesse estado, Mercúrio - dizia calmamente, com uma mão pousada no seu peito nu. - Estares nesse estado não as vai trazer de volta
- Eu já me controlei demasiado. Devia ter acabado com o rapaz quando tive a oportunidade. 
- Não digas isso. Ele não é o Tema e tu sabes isso perfeitamente. 
- Pelo que me contaste ele tem tudo a ver com ele. Olhos brancos? Ele pode ter algum poder do Tema mas ao ponto de ficar naquele estado?
- O espírito do Tema ainda deve estar muito ligado ao corpo do rapaz e à sua alma reencarnada. Principalmente com a Violet em perigo - disse Luna, sem fitar nenhum dos dois. 
- O que queres dizer? - perguntou Mercúrio, muito longe de fazer qualquer raciocínio com toda aquela raiva a palpitar. 
- O que eu quero dizer - disse Luna, a fitá-lo - é que o Tema não vai permitir a morte da sucessora da Vénus, muito menos ser a causa dela. E podes parar com esse espectáculo - concluiu, referindo-se ao estado de Mercúrio.
- Luna - chamou Sol. Luna fitou-o com os olhos frios.
- Não me fales assim agora - murmurou. - Não o faças.
- Devíamos estar a ir atrás deles - sugeriu Mercúrio, ignorando-a.
- Como? Queres morrer ao tentar atravessar a barreira da galáxia dele? - perguntou-lhe irritada.
- Se ele consegue entrar na nossa, nós conseguimos entrar na dele. Tens alguma ideia melhor? Ou vais continuar sentada?
     Luna levantou-se num ápice. Os seus olhos pareciam gelo ao contrário dos de Mercúrio que ardiam como fogo. Sol estava entre eles, de costas viradas para a sua Tal e com a mão esquerda pousada no peito do Planeta. Mercúrio baixara-se ligeiramente para poder fitar a sua neta correctamente. Luna estava tão irritada - só queria que ele se calasse. Sol tentava chegar a ela pela Ligação mas Luna desligou-se completamente disso. Mas por surpresa dos dois, ela acalmou a voz quando falou.
- Vou para dentro - Sol fitou-a de soslaio. - Por favor, sai daqui. E volta quando te acalmares. - Virou-se e entrou para dentro de casa, fechando a porta atrás de si.
     Luna sabia que discutir com Mercúrio só a iria por mais exausta e não tinha forças para isso. Ela caminhou até ao inicio das escadas que dava para os quartos e sentiu-se esgotada. Sentou-se e pousou a mão na cabeça. Doí-lhe a cabeça, o corpo, o coração. E, finalmente, como se tivesse caído daquelas escadas abaixo, uma dor atingiu-a profundamente. A realidade atingiu-a profundamente. As suas filhas foram-se. Violet estava ferida. E pior de tudo é que não tinham como salvá-las. O que iriam fazer eles agora? Luna sentiu a cabeça andar à roda. Sentia-se tonta e despedaçada. Só o pensamento de perdê-las era aterrador mas sinto-lo na sua pele, no seu coração e alma era infinitamente mais agoniante e doloroso. A sua cabeça latejava e os seus olhos pulsavam com as lágrimas a escorrer-lhe pelo rosto pálido. Luna fechou os olhos e cedeu ao silêncio que pairava dentro de casa esperando acordar do pesadelo em que vivia.

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